As cláusulas de “clawback” — mecanismos contratuais que permitem a recuperação de bônus ou outras compensações financeiras já pagas a executivos e funcionários de uma empresa — estão ganhando espaço no Brasil, principalmente entre companhias abertas que buscam melhorar suas práticas de governança corporativa.
A adoção dessas cláusulas visa assegurar a integridade financeira e o alinhamento entre remuneração e desempenho dos executivos, o conceito já é amplamente difundido nos Estados Unidos. As disposições de “clawback” são mecanismos contratuais que obrigam executivos a devolver remunerações ou benefícios recebidos, como bônus, em casos de má conduta ou desempenho insatisfatório.
Planejamento garante proteção da empresa
Segundo o advogado Enrique Tello Hadad, sócio do Loeser e Hadad Advogados, a implementação de cláusulas de “clawback” deve ser planejada para garantir a proteção da integridade financeira da empresa e dos interesses dos acionistas. “À medida que o mercado brasileiro evolui e adota práticas mais robustas de governança, espera-se que a utilização de disposições de “clawback” se torne mais comum, contribuindo para um ambiente de negócios mais transparente e responsável”, afirma.
No Brasil, ainda que não exista legislação específica sobre o tema, há normativos e práticas de mercado relacionados. A Resolução CVM 59, por exemplo, exige que as companhias abertas divulguem suas políticas de remuneração, permitindo a inclusão de mecanismos de “clawback”. O Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) também recomenda a implementação de políticas de remuneração e benefícios que possam incluir, conforme o caso, cláusulas de devolução de valores.
Estrutura e execução do clawback
Para as cláusulas serem eficazes, é essencial seguirem alguns princípios, como:
- Contratualidade: As condições para devolução de bônus devem estar claramente definidas, incluindo eventos como fraude e má conduta.
- Período de Look-Back: Período em que a devolução pode ser exigida, proporcional ao tipo de remuneração e riscos.
- Procedimento de Execução: A empresa precisa de políticas claras para investigação e decisão sobre o clawback.
A legislação brasileira ainda não exige a adoção desse mecanismo, mas normativas da CVM e recomendações do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) incentivam a prática como parte de políticas de remuneração.
Impactos e benefícios das cláusulas
A implementação de mecanismos de “clawback” traz diversos benefícios para as empresas:
- Alinhamento de Incentivos: Assegura que a remuneração dos executivos esteja alinhada com o desempenho real e a integridade financeira da empresa.
- Proteção aos Acionistas: Protege os interesses dos acionistas ao garantir que os executivos não sejam recompensados por desempenho falso ou fraudulento.
- Melhoria na Governança: Contribui para a melhoria das práticas de governança corporativa, aumentando a transparência e a confiança dos investidores.
Ambev adotou prática
A política de clawback da Ambev, por exemplo, visa recuperar remunerações indevidas de executivos que estão vinculadas a indicadores financeiros, como preço de ações e retorno aos acionistas.
Essa recuperação é aplicada em casos de republicação de demonstrações financeiras devido a erros significativos, permitindo à empresa exigir reembolso das compensações excessivas concedidas nos últimos três anos.
Existem exceções para a recuperação, como custos que superem o valor a ser recuperado, questões legais no Brasil ou impacto em planos de aposentadoria. A política está alinhada com a Lei Dodd-Frank e será adaptada conforme novas exigências da SEC e da NYSE (Manual da Bolsa de Valores de Nova York).
Projeto propõe clawback obrigatório em casos de corrupção
Um projeto de lei em tramitação no Senado (PL nº 866/2019) propõe mudanças na Lei Anticorrupção para tornar obrigatório o clawback em casos de envolvimento de dirigentes em corrupção.
Se aprovado, permitirá que empresas recuperem bônus e outros incentivos pagos a executivos envolvidos em irregularidades. Com o projeto, o Brasil avança na busca por uma maior responsabilização individual e transparência no ambiente corporativo.