Lobisomem (Wolf Man), da Blumhouse, é mais uma aposta ousada do roteirista e diretor Leigh Whannell, a mente por trás de O Homem Invisível. O filme promete mergulhar os espectadores em um suspense psicológico de tirar o fôlego, explorando as profundezas do medo e do mistério. Com um elenco de peso, Christopher Abbott (indicado ao Globo de Ouro) assume o papel de Blake, um homem atormentado por forças que desafiam a razão. Ao seu lado, Julia Garner, vencedora do Emmy, entrega uma atuação poderosa como Charlotte, sua esposa, enquanto Matilda Firth brilha como Ginger, a jovem filha do casal. A estreia nos cinemas brasileiros está marcada para 16 de janeiro de 2025, uma data que promete marcar o início de um ano emocionante para os amantes do gênero.
Diferente do que se espera de filmes tradicionais de terror ou horror, Lobisomem aposta em um suspense sofisticado, construído com uma atmosfera densa e detalhes sutis que prendem a atenção. Em vez de sustos fáceis ou violência explícita, o longa investe em uma narrativa envolvente que instiga a mente e provoca o coração. No entanto, nem tudo são acertos. Embora a construção seja intrigante, algumas pontas soltas no roteiro podem frustrar espectadores mais atentos, deixando um rastro de dúvidas que ecoa após os créditos finais. Ainda assim, a obra se destaca como um suspense corajoso, que desafia as convenções do gênero e entrega uma experiência inquietante.
História de Lobisomen
O filme começa com uma introdução visceral e carregada de tensão, mergulhando o público na infância de Blake, que vive em uma região remota cercada por florestas densas. Sob a rígida criação de seu pai, ele aprende a sobreviver em um ambiente hostil. Tudo muda quando ambos são atacados por uma criatura misteriosa, deixando cicatrizes físicas e emocionais. É nesse ponto que somos apresentados ao conceito sombrio de uma doença chamada “Cara de Lua”, um termo utilizado pelos povos originários locais, envolvendo o enigmático folclore que permeia a trama.
Trinta anos depois, encontramos Blake vivendo em um cenário completamente diferente. Ele agora mora em uma área urbana com sua esposa, Charlotte, uma jornalista determinada, e sua filha Ginger. Trabalhando como escritor, Blake demonstra ser um homem dedicado, mas atormentado por algo que não fica explícito (parece ser um senso de inadequação).
Seu mundo desaba quando recebe a notícia de que seu pai, desaparecido há anos, foi oficialmente declarado morto. Esse evento é um catalisador para sua jornada emocional, reacendendo memórias dolorosas e questões não resolvidas.
Movido por uma mistura de dever e necessidade de confrontar seu passado, Blake decide viajar para a casa isolada de seu pai para empacotar os pertences que foram deixados em testamento. Além disso, ele enxerga na viagem uma oportunidade para salvar seu casamento, tentando se reconectar com Charlotte após um período de distanciamento. Esse cenário estabelece uma atmosfera carregada de melancolia e esperança, enquanto Blake se prepara para enfrentar tanto seus demônios internos quanto os perigos reais que espreitam.
É aqui que o drama toma um rumo sombrio e eletrizante. A tranquilidade da floresta dá lugar ao caos quando a família é atacada por um lobisomem, um evento brutal que ameaça destruir tudo o que Blake construiu.
Ferido durante o ataque, ele percebe com horror que está exibindo os primeiros sinais de transformação na mesma criatura que assombrou sua infância. A narrativa ganha intensidade, misturando desespero, mistério e uma corrida contra o tempo enquanto Blake luta para proteger sua família e preservar sua humanidade.
O filme acerta tanto quanto erra
Lobisomen tenta construir uma base emocional por meio de cenas carregadas de mensagens sentimentais e diálogos entre os personagens, mas, infelizmente, essas interações não funcionam como esperado. A química não soa natural, e os esforços para criar vínculos emocionais que façam o público temer pela segurança dos personagens falham. A intenção era clara: gerar empatia para que cada morte fosse impactante. No entanto, o resultado ficou aquém do desejado.
Mas quando o filme deixa de lado essas tentativas forçadas e se concentra na transformação de Blake, é aí que ele realmente ganha vida. A atuação de Christopher Abbott finalmente brilha, entregando um desempenho convincente que envolve o espectador. O suspense se intensifica e as nuances do processo de mudança de humano para criatura selvagem são trabalhadas de maneira primorosa. O impacto dessas cenas supera até mesmo as aparições da criatura, destacando o cuidado com os detalhes psicológicos e físicos da metamorfose.
O filme não se apressa em retratar as etapas dessa transformação. Aspectos sutis, como o aumento do apetite voraz de Blake e seu temperamento imprevisível, são explorados de forma meticulosa. Uma cena particularmente impressionante é quando Blake, ao ouvir passos altos e ameaçadores, descobre que era apenas uma aranha — um reflexo de sua audição extremamente aguçada. Esses momentos oferecem uma sensação palpável de como sua humanidade está sendo corroída.
Outro elemento visual de destaque é o uso da câmera para mostrar o ponto de vista alterado de Blake. Quando enxerga pelo prisma da criatura, tudo é claro e nítido, mas sua visão de Charlotte e Ginger é envolta em sombras, refletindo sua desconexão crescente. Essa perspectiva se intensifica à medida que ele perde gradualmente a capacidade de falar, ouvir e compreender o mundo ao seu redor. A luta desesperada de Blake para manter sua sanidade enquanto morde e arranha a si mesmo como um animal selvagem é um dos momentos mais impactantes e emblemáticos do filme, revelando o quanto ele se afastou da humanidade.
No entanto, toda essa construção cuidadosa desmorona quando a transformação finalmente se completa. O filme perde sua direção, deixando de explorar o potencial dramático e simbólico dessa mudança. A narrativa torna-se confusa e sem foco, repetindo o mesmo erro cometido ao tentar forçar uma conexão emocional no início.
O problema se agrava quando o enredo muda o foco para Charlotte e Ginger, que não conseguem sustentar a atenção do público. As cenas de luta, apesar de promissoras, são curtas e mal coreografadas, diluindo o impacto. A cena final, que tinha intenção de ser um momento de clímax dramático, falha miseravelmente, beirando o cômico em sua execução. O potencial para uma conclusão memorável acaba se perdendo, deixando uma sensação agridoce de que o filme poderia ter sido muito mais do que entregou.
Semelhanças com Evil Dead
Enquanto acompanhava a transformação de Blake em Lobisomen, foi impossível não lembrar de Ash, em Evil Dead. Assim como na icônica franquia de terror, o filme de Leigh Whannell tenta capturar a essência do grotesco e do psicológico, misturando uma atmosfera sufocante com uma estética visceral. As cenas de Blake perdendo sua humanidade, tanto física quanto emocionalmente, remetem ao mesmo desconforto que sentimos ao ver Ash sucumbir e lutar contra a própria sanidade. Porém, ao contrário de Evil Dead, que consegue balancear sua narrativa com impacto e um humor macabro bem dosado, Lobisomen não atinge todo o seu potencial.
Havia uma promessa de algo grandioso, um suspense psicológico que dialogasse com o terror corporal de forma única. Infelizmente, o filme parece tropeçar em sua própria ambição, como se tivesse medo de se aprofundar nas ideias que sugeriu. Os vislumbres de genialidade — como a luta interna de Blake e os detalhes de sua transformação — são ofuscados por um roteiro que perde o foco e não sustenta a intensidade até o fim.
Lobisomen é um filme que caminha na linha tênue entre o sublime e o frustrante. Ele acerta ao entregar momentos de suspense genuíno e uma transformação rica em detalhes visuais e emocionais, mas peca ao não sustentar sua narrativa com a mesma força. É um filme de altos e baixos, com performances sólidas e ideias interessantes que acabam soterradas por escolhas mal executadas e uma conclusão que deixa a desejar.
Ainda assim, o longa merece ser assistido por sua tentativa de fugir do convencional e pela entrega de Christopher Abbott, que carrega boa parte do peso emocional da trama. Para aqueles que gostam de explorar as nuances do terror psicológico, Lobisomen pode ser uma experiência intrigante, mesmo que, no final das contas, deixe uma sensação persistente de que tinha tudo para ser muito mais do que realmente era.
Lobisomem entrega um suspense psicológico visualmente impactante e repleto de nuances intrigantes, mas tropeça ao tentar equilibrar sua narrativa emocional e seu clímax dramático, que acaba soando cômico. Apesar das falhas, a atuação de Christopher Abbott e a ousadia de Leigh Whannell fazem do filme uma experiência inquietante e fora do comum para fãs do gênero.